A entrada em vigor do Novo Acordo de Capital de Basiléia II (BIS II) pretende promover um sistema financeiro estável mediante a adequada capitalização das instituições e igualar o terreno de jogo competitivo.

O BIS II dedica grande importância à gestão integral do risco. Longe de ser unicamente uma nova fórmula para calcular o capital regulatório (tornando-o mais sensível à realidade dos riscos gerenciados), o Novo Acordo outorga maiores responsabilidades às próprias instituições, incentivando-as a utilizar as técnicas mais avançadas em todos os processos de gestão e controle da globalidade de seus riscos incorridos.

Avançar na gestão de riscos em uma instituição é uma necessidade. O BIS II indica claramente as metas estratégicas que devem ser alcançadas, mas o caminho para alcançá-las exige, em cada organização, um esforço elevado por parte de todas as áreas envolvidas.

Neste contexto, a Management Solutions, firma internacional de Serviços de Consultoria, considerou oportuno realizar uma Convenção de especialistas no assunto com o objetivo de compartilhar sua visão dos impactos de Basiléia II.

Organizada a partir de uma perspectiva regional, esta Convenção foi realizada no mês de abril passado em quatro localidades: Cidade do México, São Paulo, Santiago do Chile e Buenos Aires. Em todas elas, contou-se com a opinião de reguladores e supervisores, das principais instituições financeiras (nacionais e internacionais), assim como de especialistas independentes, constituindo-se como um marco único para compartilhar experiências sobre os Impactos de Basiléia II na gestão de riscos das Instituições Financeiras.

Este documento pretende resumir as principais questões abordadas ao longo da mencionada Convenção, onde foram tratados aspectos como as vantagens aportadas por esta nova norma para os modelos de gestão, foram compartilhadas experiências atuais de processos de implementação e foi analisado como será modificada a função da autoridade supervisora.

 

Antecedentes

Origens

A percepção do risco existe desde a origem dos tempos. O homem tenta livrar-se do risco por transferência ou compartilhamento.

Já no século XX a.C., o Código de Hamurabi, na Babilônia, estabelecia o compartilhamento de perdas por acidente de trabalho (naval) e perdas comerciais. Posteriormente, a lei de Rodas na Grécia ou o contrato Mutuum (crédito mútuo) em Roma avançam neste conceito. No século I, é estabelecido o empréstimo à grossa, pelo qual um armador recebe o dinheiro antes do traslado e, ao chegar ao porto, o reembolsa com juros; se não chegar, porém, fica com o dinheiro.

Esses antecedentes têm uma característica comum: capital em risco em dinheiro e equivalente à perda máxima.

Probabilidade

Um elemento essencial para avançar na teoria do risco é constituído pela probabilidade. Na Babilônia, parece estar a origem da roda (século XXXV a.C.) e, com ela, o surgimento da roleta. Os dados aparecem no Egito (século XXVII a.C.), posteriormente no século XV aparecem os naipes. Todos esses elementos são essenciais para entender o conceito de probabilidade.

É necessário esperar até o século XVI para que Pierre de Fermat e Blaise Pascal fundamentem a teoria das probabilidades em uma troca de cartas para avaliar o preço do risco que um amigo comum estava assumindo.

No século XVII, as casas de jogo colocam em prática um avanço fundamental na teoria do risco ao introduzir uma dissociação entre o Capital Efetivo e o Capital em Jogo (efetivo + probabilidade): todos apostam contra a casa e a casa não precisa ter a soma de capitais dos apostadores.

Seguro

Pierre de Fermat e Blaise Pascal não chegam a formalizar o conceito de capital econômico, a origem está na atividade de seguros e, mais concretamente, no Lloyds. Por volta do século XVII, esta instituição era uma famosa taberna que oferecia a bebida da moda (o café), e onde, para saciar o furor pelo jogo, eram feitas apostas sobre o êxito da chegada dos navios de café. Os armadores aproveitaram este fato para, jogando contra si mesmos, garantir de certa forma seu carregamento.

Poucos anos mais tarde, após o incêndio de Londres, Jacobo Bernoulli estabelece a lei dos grandes números: a freqüência tende assintoticamente à probabilidade quando os casos se aproximam ao infinito (por exemplo, cara/coroa).

No século XVIII, Abraham de Moivre determina em 1734 o teorema central do limite(1) e Daniel Bernoulli (sobrinho de Jacobo), elabora em 1738 a teoria clássica do risco, introduzindo o conceito de nível de confiança nas distribuições normais e propondo os processos de convolução.

Posteriormente e já no século XIX, Filip Lundberg simplifica a convolução e introduz os conceitos de freqüência e intensidade (severidade) em uma Poisson Composta.

Bruno de Finetti, já no século XX, fecha o círculo relacionando o capital com o preço mais um coeficiente de segurança (compartilhamento do risco).

ALM

Os ourives de Londres no século XVII introduziram o conceito do encaixe fracionário (risco de liquidez) ao emprestar parte do ouro que guardavam, arbitrando com o prazo.

Este conceito foi adotado posteriormente por alguns bancos (Riskbank da Suécia e o Banco da Inglaterra).

Em paralelo, Isaac Newton e Gottfried Leibnitz estabelecem o cálculo diferencial (a utilização de derivadas).

Já no século XX, Frederick Mackaulay e Frank Redington introduzem os conceitos de duração e convexidade, e com eles o de imunização:

Imunização: Igual Duração, Convexidade de Ativo > Convexidade de Passivo

Mercado e Crédito

A estatística moderna tem origem no século XIX, com a introdução dos conceitos de correlação e regressão entre variáveis, realizada por Francis Galton.

Posteriormente, Harry Markowitz e William Sharpe estabelecem a teoria de carteiras (ativos imunizados por outros ativos).

Já no século XX, Fisher Black, Myron Scholes e Robert Merton estabelecem a fórmula de precificação das opções (duas equações com três incógnitas) e introduzem o conceito de réplica de carteiras (fazer portfólios de ativos arriscados que fiquem livres de risco por algum tempo).

Regulamentação

Considerando o histórico mencionado, parece lógico imaginar que existisse a necessidade de estabelecer padrões mínimos que garantissem níveis de capital adequados no sistema financeiro.

Em 1913, o Federal Reserve estabelece requisitos mínimos de capital.

Em 1930, foi criado o Banco Internacional de Pagamentos, em Basiléia.

Neste contexto, foram gerados os acordos de capital conhecidos como BIS I e BIS II.

Basiléia II (BIS II)

O novo acordo de capital, denominado Basiléia II ou BIS II, procura potencializar a estabilidade dos sistemas financeiros com a capitalização adequada das instituições e igualar o terreno de jogo competitivo.

O BIS II pretende substituir o acordo de capital anterior (BIS I) que data de 1988, e que estabelecia, em termos gerais, a necessidade de manter um capital mínimo equivalente a 8% dos riscos assumidos. Este capital, denominado "regulatório", busca garantir a solvência das instituições frente a possíveis perdas geradas por suas posições de risco de crédito, de câmbio e de mercado não cobertas mediante provisões.

O BIS I contribuiu, sem dúvida, para fortalecer os padrões internacionais de determinação de necessidades de capital. Sem dúvida, o BIS II implica em um importante salto qualitativo frente à norma anterior, dado que:

  • Permite uma cobertura completa dos riscos atuais do negócio financeiro
  • Incorpora novas modalidades de riscos não contempladas pelo BIS I
  • Estabelece uma metodologia de cálculo de capital mais sensível aos mencionados riscos
  • Aproxima os requisitos de capital regulatório ao capital econômico

Tudo isso preservando também o princípio de neutralidade de capital, isto é, a manutenção dos níveis atuais de capitalização do sistema financeiro.

O que é BIS?

Através de seus três pilares, o BIS II se converte em uma ferramenta de inestimável valor para melhorar nossos modelos de gestão atuais:

PILAR 1

O primeiro pilar faz referência à metodologia de cálculo do capital regulatório necessário para cobrir adequadamente o risco de crédito, o risco de mercado e o risco operacional. Sua aplicação incentiva a utilização das técnicas mais avançadas de medição de riscos. Para medir o risco de crédito, a nova norma permite optar por dois métodos de cálculo:

  • O método "padrão" (ou standard)
  • Método IRB (Internal Ratings Based) se forem utilizados modelos internos de rating/scoring para a obtenção dos parâmetros de Risco (PD, LGD e EAD)

No caso do Risco de Mercado, o Pilar 1 não incorpora novidades em relação à modificação de Basiléia I em 1996, mantendo-se portanto:

  • Utilização do método "padrão" (ou standard)
  • Utilização de "modelos internos" baseados no cálculo do Valor em Risco (VaR) sujeito à aprovação do supervisor

Por último, o Pilar 1 incorpora a novidade do cálculo do consumo de recursos próprios por Risco operacional. A medição deste risco também pode ser realizada através de:

  • Modelos "básicos ou padrão" como uma porcentagem sobre os resultados anuais
  • Através de modelos internos - AMA - cuja construção baseia-se na modelização das perdas operacionais

PILAR 2

O segundo pilar de BIS II é dedicado ao novo papel outorgado aos organismos reguladores do mercado. Potencializa as faculdades supervisoras, já que incrementa a capacidade de auto-avaliação dos níveis de capital por parte das instituições que disponham de um modelo de "capital econômico" que integre adequadamente a totalidade dos seus riscos.

Portanto, o Pilar 2 fomenta um modelo de relação mais eficaz entre todos os participantes, graças à utilização de mecanismos de avaliação mais afinados às necessidades de recursos próprios de cada instituição financeira em função de seu próprio perfil de risco.

PILAR 3

O terceiro e último pilar está encarregado de melhorar a transparência de informação perante terceiros.

Voltado para o mercado, o Pilar 3 exige que as instituições forneçam uma informação clara sobre seu perfil de risco, assim como sobre as atividades e os controles utilizados para mitigar os riscos assumidos.

Por sua vez, se adequa à solicitação de informação regulatória às novas possibilidades de auto-avaliação concedidas, para poder garantir a adequada supervisão do sistema.

Sem dúvida, este aumento de transparência permitirá às instituições avaliar as boas práticas desenvolvidas na estrutura da gestão integral do risco e potencializar a estabilidade de sua relação com os mercados.

Impacto de BIS II para as Instituições Financeiras

BIS II não é uma mera atualização da metodologia de cálculo do capital regulatório, trata-se de um verdadeiro meio para conseguir dispor de um "modelo integral de gestão de riscos". 
Portanto, as instituições que tiverem implantado BIS II em seus processos e sistemas estarão em uma posição de vantagem competitiva perante o mercado, dado que:

  • Estarão preparadas para uma tomada de decisão de aceite ou recusa de operações mais ágil, confiável e objetiva
  • Poderão calcular a rentabilidade de suas operações e carteiras de acordo com o risco incorrido (modelos RAROC), assim como determinar o preço de referências das operações (pricing)
  • Serão capazes de alocar de forma mais eficiente seus recursos próprios
  • E inclusive gerar, se for o caso - e sempre dependendo de aprovação do supervisor - economias de capital ­­regulatório e melhorias na conta de resultados

Porém, sobretudo, BIS II permite que as organizações tenham plena consciência sobre o nível e a natureza de alguns riscos que atualmente não estão sendo mensurados da forma mais adequada.

Porém, implantar BIS II em uma organização não é tarefa fácil e requer uma verdadeira mudança de cultura. De fato, nos países onde o cumprimento de BIS II é obrigatório, os reguladores estão exigindo das instituições uma verdadeira integração do modelo dentro de sua estrutura geral de gestão e controle do risco.

Portanto, alcançar esta implantação efetiva implica realizar um projeto ambicioso, de grande alcance, com um importante envolvimento da Alta Direção e das diversas Áreas e Departamentos afetados.

Em termos gerais, esse projeto exige:

  • Uma adequação das estruturas organizacionais internas
  • Um redesenho da totalidade dos processos de gestão do risco
  • A realização de um esforço elevado para desenvolvimento e implantação de modelos matemáticos
  • Efetuar um investimento razoável em sistemas de informação e ferramentas de gestão do risco


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